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  • Foto do escritorEliane Silva

Transformando Suor em Ouro




Desde a infância


Carioca, é o segundo dos 5 filhos de uma família classe média, tinha uma vida de intensa atividade física quando não estava na escola. Os pais acreditavam que o esporte era um complemento na formação dos filhos. Por isso, Bernardinho praticou judô, em que aprendeu valores de disciplina e raciocínio, e voleibol com os amigos na praia. Foi Vitorio Mendes de Moraes, que já jogava no Fluminense, quem identificou o talento dessa turma que jogava na praia. Teve como treinador Benedito da Silva, o “Bené”, conhecido como “fazedor de craques”, que foi de grande influência para Bernadinho e com ele aprendeu a importância do trabalho em equipe, motivação e a paixão pelo voleibol, além das primeiras noções de liderança. Na década de 70, o esporte não era considerado uma profissão no Brasil. Por isso, iniciou a faculdade de engenharia, desistiu e passou para economia onde conseguiu identificar uma correlação com o voleibol, aprendendo a fazer o melhor possível com recursos limitados, chegou inclusive a fazer estágio no banco Garantia.


O atleta


Inspirado por Pat Tillma – jogador de futebol americano, que mesmo sem o biotipo ideal treinou obstinadamente até se tornar jogador profissional e ganhar milhões de dólares por ano – percebeu que com determinação mesmo um jogador ordinário pode se transformar em um talento excepcional, se treinar com afinco e ter hábitos de vida saudáveis. Assim, ele se dedicava nos treinos, e mesmo tendo sido campeão brasileiro infanto-juvenil 1974 e do Campeonato Sul-Americano de Juvenis 1978, foi cortado do primeiro mundial. Apoiado nas palavras de consolo do pai, Bernardinho ficou triste, mas não desistiu, não ficou pensando sobre qual era o seu destino, ele só tinha um objetivo: jogar bem! A partir dessa decisão, ele se tornou um profissional insatisfeito consigo mesmo e obcecado por treinos. Ele compartilha do pensamento de Michael Jordan de que os jovens devem iniciar no esporte não pela fama e fortuna, mas cientes das restrições e focados no aperfeiçoamento físico e técnico.


Temperamento


Bernardinho se auto definia com 2 características: “a do jogador obstinado e a do reserva metido a técnico”. Escalado como reserva pela seleção brasileira de vôlei, teve a oportunidade de observar o estilo, as táticas e estratégias dos outros jogadores. Com isso, via-se no direito de discutir e exigir mais dos companheiros de time. Até hoje ele não aceita o “desperdício de talento”. Durante um amistoso ficou tão alterado com toda a equipe, que foi expulso do banco de reservas. Sua autocrítica não admitia menos que 100% de si próprio e de seus colegas. Quando finalmente foi convocado para jogar nas Olimpíadas “estourou o menisco do joelho esquerdo”. Foi operado. O tempo estimado de recuperação era de 3 meses, mas ele se esforçou e conseguiu estar apto para jogar novamente em apenas 28 dias. Em 1984, nas Olimpíadas de Los Angeles, a seleção brasileira ficou em segundo lugar num jogo contra os Estados Unidos, num tempo em que o vôlei brasileiro começou a ganhar visibilidade. Essa foi a última Olimpíada como jogador e posteriormente em 1986 se despediu da seleção brasileira.


O treinador


Aposentado como jogador de vôlei aos 30 anos se viu perdido, sem saber com o que trabalhar. Foi trabalhar com seu irmão Rodrigo e a sua cunhada, que eram sócios do restaurante Delírio Tropical no Rio, onde reforçou seus conhecimentos sobre trabalho em equipe. Mas em 1989 a ex-jogadora de vôlei Dulce Thompson, que tinha percebido em Bernardinho as características necessárias para ser um treinador, disse a ele: “[você] conhece voleibol, tem capacidade de liderança, é perfeccionista, um chato, um cricri”. Assim nasceu a primeira experiência como treinador, no time feminino do Perugia, na Itália. O time do Perugia estava à beira do rebaixamento, mas mesmo assim ele preferiu aceitar o desafio de salvar o time do que abandonar sua paixão pelo voleibol. As jogadoras acostumadas a perder, agarraram a chance de uma possível vitória com a chegada do novo técnico, que chegou com sede de mudança, exigia 2 treinos diários.

“Há líderes que inspiram pelo discurso, outros pelo que fazem e conquistam. Bernardinho é um líder raro que nos toca com as palavras ao mesmo tempo que inspira, faz, conquista e transforma como ninguém suor em ouro, pessoas em times, talento em vitórias.” – Carlos Alberto Júlio”

Para levantar o time era necessário fazê-las acreditar no comprometimento e cumplicidade, para que dessem o máximo de si mesmas. Ele estudava não só sobre esporte, mas também sobre liderança, coach e gestão de pessoas. O time foi salvo do rebaixamento e duas vezes vice-campeão da Copa Itália, mas os salários do Perugia estavam atrasados, o que levou Bernardinho para o time masculino de voleibol de Modena, que não estava em um período tão favorável. Ele justifica o período ruim pela falta de planejamento.


Seleção feminina


De volta ao Brasil, em 1993 foi convidado para ser técnico da seleção feminina de vôlei. Um time com ótimas jogadoras, mas com sérios problemas de relacionamento. Para formar uma boa equipe é necessário condicionamento físico, colaboração tática e emocional e senso de equipe. Com a equipe feminina de vôlei, Bernardinho ganhou destaque e conquistou vitórias importantes para o voleibol feminino. A vitória no campeonato “Gran Prix” contra Cuba, transformou as jogadoras brasileiras em celebridades, musas. A imprensa interessava-se nos hábitos pessoais delas, mas Bernardinho, temendo que as jogadoras perdessem o foco, mesmo sob protestos, proibiu as entrevistas até o final do Campeonato Mundial.

“Vencer não é tudo, mas dar tudo pela vitória é a única coisa que importa.”

Acreditar em sua capacidade é essencial para decidir seu futuro. O PhD Dov Eden usa a teoria da “profecia autorrealizável”, que consiste em influenciar o acontecimento de algum evento a partir de uma crença e dedicação, ou seja, rotular alguém é contraproducente. Assim foi com Leila, subestimada pelo antigo treinador, ela não se desenvolvia. Bastou depositar nela o desafio da autossuperação para que ela se destacasse e saísse da condição de reserva para titular da seleção.


A orquestra


Para Bernardinho, um time é como uma orquestra, em que o trabalho de todos faz um único e belo resultado. Mas como lidar quando há solistas na equipe? As vezes um jogador é excelente e ele acha que fazer o seu bem feito é suficiente, não se importando com os demais da equipe. Assim era com Fernanda Nuzman. A insistência para transformá-la de solitária para solidária com a equipe foi tão intensa que acabou se casando com ela. Por melhor que seja um jogador, ele não traz resultados sozinho. Por isso a importância de fazer com que todos participem da mesma sinfonia com a mesma sintonia. Em 1999 Fernanda e mais 8 jogadoras deixaram a seleção por diversos motivos. Entretanto, outras ficaram e fizeram uma boa relação com a nova geração que chegava. Foi tão empolgante, que chegaram a treinar por 15 dias ininterruptamente. O bronze conquistado nas Olimpíadas de Sidney foi a última conquista de Bernardinho pela seleção feminina.

“Sucesso é o resultado da prática constante de fundamentos e ações vencedoras. Não há nada de milagroso no processo, nem sorte envolvida. Amadores aspiram, profissionais trabalham.” – Bill Russel”

Bernardinho acredita que é a equipe quem faz o resultado e não só um indivíduo, por melhor que ele seja. E para ter bons resultados, é necessário, além do planejamento, que haja uma forte relação de confiança e comprometimento como a base do relacionamento entre os membros da equipe, seguido de disciplina, ética, hábitos positivos, trabalho em equipe, motivação e liderança. Por isso, tanto na seleção feminina e posteriormente na masculina, ele propôs que do prêmio destinado ao melhor jogador metade seria dividido entre os demais membros da equipe e a equipe masculina não só entendeu a mensagem de solidariedade e espírito de equipe como seguiu adotando essa regra para todas as competições sem que lhes fosse solicitado. O clima de equipe ficou muito evidente também quando na comemoração pelo tetra na Liga Mundial, os titulares trouxeram para a quadra os jogares lesionados que não puderam jogar e todos juntos fizeram uma bela comemoração.


Seleção masculina


Após os Jogos Olímpicos de Sydney, Bernardinho se despediu da seleção feminina e iniciou na masculina. Começaram ganhando da Itália na Liga Mundial. Na sequência, ganharam quase todas as competições e conquistaram destaque no circuito mundial. Mesmo diante das vitórias, Bernardinho seguia com o ritmo, considerado por muitos como obcecado por treinos. Para ele, os jogadores não podem cair na armadilha de se acomodar no momento de sucesso. Inicialmente, Bernadinho sentiu dificuldade em trabalhar com os homens que, por uma questão cultural, demonstram menos sentimentos e assim era mais difícil ter uma percepção mais afinada com a equipe. Depois de um ano trabalhando juntos, os jogadores começaram a ficar indiferentes a ele, diante do excesso de cobrança. Treinavam sob toda e qualquer circunstância, inclusive imediatamente depois de uma longa viagem para um campeonato ou durante uma conexão de cinco horas entre um voo e outro. Como resultado de tantos treinos veio o título tão almejado: Campeão da Liga Mundial, na Espanha.

“Os problemas (…) que preocupam todas as pessoas no cada vez mais competitivo ambiente profissional: Como trilhar os caminhos da vitória, encarar os desafios e pressões e, o mais importante, o que fazer para permanecer no topo.”

Mas uma equipe vencedora traz um desafio: “O que fazer para continuar crescendo?” A pressão para continuar trazendo bons resultados às vésperas das Olimpíadas de Athenas vinha de todos os lados. Da imprensa, nas ruas. O país inteiro contava “só” com o ouro. A equipe brasileira ficou no grupo conhecido como “o grupo da morte” dentre as seleções mais difíceis do mundo. Houveram vitórias e algumas derrotas, mas conseguiram chegar à final. O que merece destaque nesse campeonato tão importante para o esporte são os ensinamentos e a postura do líder da equipe, que soube desenvolver a motivação da equipe, a dedicação e o comprometimento dos jogadores nos treinos, a vontade de lutar. Mas o que esse time tinha de especial era não se deixar dominar pela vaidade por ser um time de estrelas. Assim, na final jogando contra a Itália, veio o resultado, fruto de toda dedicação da equipe. O Brasil foi o campeão olímpico de Athenas, no berço dos Jogos Olímpicos, depois de anos de absoluta entrega.


Escala de valores


Bernardinho ficou na seleção masculina durante cinco anos e nesse período aplicou e estudou a “Pirâmide do Sucesso” de John R. Wooden e incluiu nela alguns conceitos mais dinâmicos e circulares para formar a “Roda da Excelência”. Ele teve a oportunidade de aprimorá-la quando tornou-se palestrante e pôde discutir seus métodos com empresários. Assim nasceu a “Escala de Valores” que vem complementar a Roda da Excelência, através da escolha de talentos, espírito de equipe, definição de líderes dentro do grupo, treinamento extremo, fatores externos e as armadilhas do sucesso. Bernardinho se dedica ainda ao estudo multidisciplinar principalmente em gestão de pessoas e coach para estimular o desenvolvimento de talentos, especialmente por que o esporte não é um produto ou serviço que podem ser oferecidos. No esporte, o resultado depende do desempenho físico, emocional e técnico de pessoas. O mantra de Bernadinho é: “Após uma grande conquista, é preciso redobrar a atenção com os detalhes para que o processo de crescimento seja contínuo.”

“Todos os dias, ao levantar, piso na minha vaidade para que ela não me desvie do meu caminho.”

Quais características definem um time ou uma empresa com alto rendimento e resultados expressivos? As principais características são capital financeiro, inovações tecnológicas e capital humano. Porém é importante ressaltar que riqueza não é sinônimo de bons resultados. Se assim fosse, o Real Madri teria conquistado todos os campeonatos que participou. De nada adianta investimento financeiro sem motivação, cumplicidade e extrema dedicação no processo de preparação. A inovação é importante, porém não é duradoura diante da intensa competitividade. Por isso, a importância de se diferenciar criando um novo conceito ou uma nova necessidade, e assim ganhar vantagem diante dos concorrentes.

“Se você deseja um ano de prosperidade, cultive grãos. Se você deseja 10 anos de prosperidade, cultive arvores. Mas se você quer 100 anos de prosperidade, cultive gente.” – Ditado Chinês”

O passo importante para um resultado expressivo é o recrutamento de talentos, que devem ser analisados: capacidade técnica, mas com virtuosismo, verificar o “track record” ou histórico de resultados da pessoa (alguém capaz de fazer muito com pouco orçamento, por exemplo), o nível de determinação (até que ponto está disposto a se entregar pelo projeto) e um ponto de intensidade máxima: a paixão, o brilho no olhar.


Educação é a chave


Nas vitórias é que vivenciamos o momento mais emocionante. Cantar o hino nacional diante do hasteamento da bandeira nos traz o real sentimento de representantes da nação e nessa hora vem o pensamento: “Seria possível um verdadeiro time chamado Brasil, onde a consciência coletiva predominasse, onde pudéssemos entender e explorar o real potencial de nossos talentos complementares?” Com esse pensamento, e baseado na sua trajetória de sucesso por meio de extrema dedicação e estudo, Bernardinho associa os valores e princípios esportivos como ferramenta importante no processo de educação.

“Só chegaremos à vitória se nos entregarmos como um verdadeiro time ao treinamento, à preparação, ou seja, à educação.”

O esporte, além de democrático ajuda as pessoas a compartilharem suas experiências e superações. Bernardinho, juntamente com a Unilever e o auxílio de outros profissionais, em 1997 criaram o centro Rexona-Ades de Voleibol, onde 20 mil crianças já foram atendidas e 150 professores foram capacitados na iniciação do vôlei. Além desse projeto, surgiu também o Instituto Compartilhar, entre outros projetos esportivos por todo o Brasil.


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